domingo, 28 de agosto de 2011

Eles fizeram história no mercado imobiliário

  Três corretores de imóveis contam como enfrentaram os desafios e as dificuldades  da profissão, em tempos que a atividade era pouco reconhecida pela sociedade

A área de corretagem imobiliária passou por várias fases até se consolidar com a força que tem hoje. E se o setor chegou neste patamar, é porque desde o início da atividade, há corretores de imóveis que enfrentaram dificuldades, desde o relacionamento com o cliente até as restrições para divulgação de imóveis. Tudo isso para abrir o caminho para os profissionais que aos poucos foram reconhecendo a atividade como uma das mais promissoras. Relatamos três histórias de corretores que, mesmo diante das dificuldades, não desistiram da profissão e vêem a atividade com orgulho.

“Trabalhei em prol da fundação das entidades do setor no CE”

“Iniciei minha carreira em 1965, aos 26 anos. Na época eu trabalhava em uma empresa no qual viajava muito e chegava a passar 90 dias fora de casa. Quando precisei viajar por seis meses e na volta para casa meu filho mais velho não me reconheceu, vi que era a hora de buscar outra atividade. Nesse intervalo, vendi um imóvel para uma família conhecida e ganhei a comissão que era praticamente o salário que eu ganhava todo mês. Foi quando decidi me dedicar à atividade de corretor de imóveis. Na época, o trabalho do corretor de imóveis era visto por muitos como  picaretagem. Destacavam-se aqueles que tinham uma família de renome, pois esta era a forma de passar credibilidade e ter um acesso facilitado ao investidor.

Em Fortaleza (CE), não tinha conselho da categoria, apenas uma associação com pouca atuação, onde eu e mais um grupo de profissionais reabilitamos. Trabalhei em prol da fundação de todas as entidades de classe do setor no Ceará, desde delegacia do Creci, Secovi, Câmara Imobiliária.

Naquela época, este grupo que ficou conhecido como os “18 do Forte”, e para aprimorar a nossa atuação, buscávamos mecanismos para conhecer os trâmites, principalmente na área de documentação, uma vez que em Fortaleza não havia nenhum curso de qualificação na área imobiliária.

Como precisávamos ter um conhecimento desta demanda, os proprietários dos cartórios nos davam aulas sobre registro de imóveis.

O anúncio para nós era tudo e uma das poucas maneiras de divulgar os imóveis. Transferimos nossos anúncios para o Jornal O Povo, no qual os corretores de imóveis do Ceará ainda hoje têm uma história ligada a este veículo de comunicação. Logo depois, o Diário do Nordeste também entrou com força nesse mercado.

Como não tínhamos internet, nem email, o vínculo com o cliente era fundamental. Mas a indicação tinha um grande peso. Assim desde a visita dos investidores até o fechamento do negócio era realizado com dificuldade. Só sobrevivia no mercado quem tivesse dignidade. Mas felizmente, nosso grupo realizou um trabalho ético e dignificou a profissão no Estado. Pode-se dizer que abrimos a estrada.

Vejo que a profissão teve duas etapas. Com a Lei nº 2.520 saímos da ignorância para as letras. Saímos da profissão que não tinha sido alfabetizada para uma profissão que exigia no mínimo o segundo grau completo. Começamos a ter um grupo de pessoas mais elitizadas e logicamente isso traz novas ideias. Se eu tivesse que começar na atividade, hoje sim que iniciaria a carreira de corretor de imóveis, a qual considero uma das mais promissoras do Brasil.”

Antônio Armando Cavalcante Soares, atua há 46 anos como corretor de imóveis. Atualmente é Diretor Tesoureiro do Sistema Cofeci-Creci.

“A principal dificuldade era conseguir um financiamento imobiliário”

“Quando iniciei, o mercado imobiliário estava tomando os primeiros passos como uma verdadeira profissão, na visão da própria sociedade e das construtoras. Fiz um curso rápido na própria imobiliária em que trabalhava e no primeiro plantão já vendi uma casa. Já havia o curso de Técnico em Transações Imobiliárias, pelo Senac, e decidi fazer posteriormente para me inteirar dos assuntos relativos à profissão, embora não fosse obrigatório.

Vejo que os cursos naquela época eram melhores. Tínhamos professores da faculdade de Direito, Engenharia, Arquitetura, com um conhecimento mais específico, embora não tivessem a visão comercial. Por isso que há uma leva de corretores antigos (que na época tiveram a oportunidade de estudar), que hoje possuem um conhecimento maior. Posteriormente, programas de aperfeiçoamento foram criados pelo conselho da categoria, com cursos voltados à avaliação imobiliária, Direito Imobiliário, contratos, entre outros.

Lembro que o relacionamento com o cliente era muito pessoal. Realizávamos plantões de venda em prédios e também em lojas para vender imóveis usados, cuja quantidade era maior que os lançamentos. Os clientes não tinham tanto conhecimento. A concorrência proporcionalmente era acirrada, considerando a disponibilidade no mercado, mas não como hoje.

A principal dificuldade era conseguir um financiamento imobiliário, pois era muito burocratizado e os clientes tinham medo. A Caixa Econômica era a instituição que fornecia os financiamentos e os próprios funcionários desconheciam este processo. O corretor de imóveis levava até 190 dias para obter a liberação. E sem dinheiro, ninguém compra nada. Muitas vezes perdiam-se negócios em função da demora e ficávamos de mãos atadas, dependentes das políticas que mudavam a hora que bem entendiam.

O perfil do corretor de imóveis melhorou muito. Hoje existem profissionais mais preparados e o próprio mercado está mais exigente. No Brasil, pelo menos 62% dos corretores de imóveis já fizeram algum curso superior. A própria atividade começou a ficar dinamizada através da tecnologia. Redes Imobiliárias estão sendo desenvolvidas e vejo que este é o caminho, pois boa parcela dos clientes já utilizam estes meios para buscar um imóvel. A concorrência funciona com maior eficiência. Os meios de comunicação são mais rápidos do que há anos atrás, onde anunciávamos em um pequeno espaço nos jornais de grande circulação, pois não tinha caderno de imóveis, apenas colunas.”

Flávio Koch, atual presidente do CRECI-RS, atua há 43 anos como corretor de imóveis.

“No início, víamos a internet com certa reserva”

“Entrei para a área de corretor de imóveis quase sem querer. Jamais havia planejado, até porque não tinha experiência na área de venda de imóveis. Eu era representante comercial e com a transferência da empresa para o Rio de Janeiro, fiquei desempregado. Até que fui convidado por um amigo para atuar na área de locação em uma imobiliária. No início fiquei receoso, pois não entendia do assunto. Mesmo assim, aceitei o desafio, em 1983.

Durante os primeiros seis meses de trabalho precisei estudar e pesquisar muito acerca de leis locatícias. Na época não havia cursos na região sobre a área imobiliária. Tanto que tive dificuldade em conseguir a inscrição para o CRECI em Santa Catarina, e fui obrigado a fazer um curso à distância oferecido em Porto Alegre. A cada dois meses eu ia ao Rio Grande do Sul prestar exames. Lembro que na turma em que iniciei havia aproximadamente 250 inscritos e terminamos o curso em apenas 15 pessoas, pois era muito difícil. As avaliações eram diferentes de hoje. Na prova final, apontaram um imóvel em uma rua próxima ao Conselho e tivemos que fazer a planta baixa com as devidas medidas. Passamos um domingo inteiro com a fita métrica no bolso, para ser avaliados no fim do dia.

Naquela ocasião a área de corretagem imobiliária estava muito desorganizada, com um número grande de profissionais sem preparo, sem inscrição, mas o trabalho era de forma aberta. Após um período trabalhando na área locatícia e depois em vendas, abri meu próprio negócio junto com outro sócio. O início das atividades como sócio-proprietário da Imobiliária Ouro Preto não foi fácil. Tínhamos uma classe desacreditada em função do mau comportamento de alguns corretores. Outro fator é que as grandes empresas se destacavam no Estado e as pequenas imobiliárias eram quase imperceptíveis. Até construir a imagem de uma empresa séria foi um caminho complicado. Após três anos de atuação, encerrei as atividades da Imobiliária Ouro Preto para abrir em sociedade com Dalírio Beber, a Skala Administradora de Bens, empresa até hoje está no mercado.

Só anunciava imóvel a imobiliária que tinha dinheiro. Anúncio em rádio não era viável, pois o alcance não era como dos jornais. Isso levou muitas empresas a se sujeitarem a pagar o preço.

Mas buscávamos outras alternativas, como distribuição de panfletos, propaganda boca-a-boca e através das placas. Também tínhamos dificuldade, pois nem todos os proprietários nos davam exclusividade.

Quando a internet começou a entrar no mercado imobiliário existiu um conflito grande com os jornais, que tentavam de todas as formas segurar boa parte da fatia deste setor. Participamos de diversas reuniões, jantares oferecidos pelos jornais para este objetivo. Nós víamos a internet com certa reserva, achávamos que era restrito às pessoas com alto poder aquisitivo, mas hoje é o principal fenômeno que impulsiona a divulgação dos imóveis no mercado.”

João Ubaldo Stüpp iniciou a carreira em 1983, e atualmente é proprietário da Skala Administradora de Bens, em Blumenau-SC.

Nenhum comentário:

Postar um comentário